Amplamente utilizado na medicina popular como revigorante e estimulante físico e mental, o guaraná pode ter novas aplicações terapêuticas. Pesquisadores da área de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) comprovaram a atividade anti-inflamatória da planta.
O guaraná é uma das plantas com maior número de registro de fitoterápicos no Brasil, porém, todos relacionados à sua ação estimulante. “Estamos agregando valor a uma planta que é brasileira, que tem potencial para o tratamento de outras doenças. Assim, também valorizamos nossa biodiversidade”, enfatiza a coordenadora da pesquisa, Rachel Castilho.
A partir de informações populares de outros usos do guaraná, como analgésico, antitérmico, antimicrobiano, antioxidante e imunoprotetor, investigou-se a atividade do extrato padronizado do pó das sementes do guaraná e os seus principais constituintes químicos. A equipe de pesquisadores descobriu que ele inibe o TNF-alfa, que é uma citocina inflamatória responsável pelo desenvolvimento de diversas doenças, como a artrite reumatoide, colite ulcerativa, psoríase, doença de Crohn, entre outras. O TNF-alfa desempenha papel chave na inflamação aguda e crônica, por isso muitas pesquisas têm buscado explorar o potencial desse mediador no tratamento de doenças inflamatórias. “O número de medicamentos desenvolvidos e aprovados para o tratamento de doenças inflamatórias causadas pela TNF-alfa é pequeno, e, além disso, eles têm alto custo e diversos efeitos adversos relacionados. Assim, é um grande passo comprovar o potencial do guaraná na terapia anti-TNF”, explica Castilho.
Metodologia
Na primeira fase da pesquisa, foi realizada a padronização do extrato da planta, com a identificação dos constituintes e sua quantificação. “Esta padronização é feita para tornar possível determinar a dosagem de cada constituinte no extrato e, no futuro, a posologia, isto é, sabermos quanto existe de cada substância química em determinada dose”, diz Castilho.
Após a quantificação, os pesquisadores da UFMG começaram a realizar as análises farmacológicas. Os estudos pré-clínicos, in vitro, já confirmaram a ação anti-inflamatória frente ao TNF-alfa do extrato padronizado do guaraná, e o pedido de patente já foi realizado pela UFMG.
O próximo passo é fazer os ensaios in vivo, isto é, em animais. Nesta etapa, os pesquisadores avaliarão como o extrato padronizado se comporta em experimentos com animais. Também será avaliada a farmacocinética – como as substâncias são absorvidas e eliminadas pelo organismo – e também a toxicidade do guaraná. “Serão realizados diversos testes, com doses diferentes, contra doenças diferentes, e também a aplicação no tratamento e com ação preventiva”, comenta a coordenadora do projeto.
Tratamentos
Após a realização dos testes em animais, de acordo com os resultados obtidos, o grupo pesquisa a possibilidade de desenvolver um fitoterápico do guaraná. “Mas, se a substância nova identificada no extrato for muito ativa, podemos inclusive criar um fitofármaco”, destaca Rachel Castilho. Fitofármacos são medicamentos à base de plantas que contêm o princípio ativo isolado, ou seja, que contêm uma substância medicamentosa isolada a partir do extrato da planta. Já nos fitoterápicos os princípios ativos não são isolados.
“Não há muitos fármacos disponíveis no mercado tendo como alvo o TNA-alfa. Nossas expectativas são as melhores possíveis: que realmente consigamos desenvolver um novo medicamento a partir de uma planta essencialmente brasileira. É uma inovação”, conclui.
Parceria que viabiliza
A pesquisa recebe financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e é gerenciada pela Fundep. “Realizamos a gestão administrativo-financeira da iniciativa, que ainda está em plena execução. Até o momento, foram efetivadas compras de material de consumo. Aquisição de equipamentos também estão previstos. A professora Rachel Castilho é nossa parceira há 10 anos”, conta Waldênia Silva, da Gerência de Atendimento a Projetos (GAP) Fapemig.