Em uma sociedade que assegura em lei as liberdades individuais dos cidadãos, é difícil acreditar que existam ataques a esses direitos, como o trabalho escravo e o tráfico de pessoas. O problema se agrava quando tais crimes não têm canais acessíveis para denúncias e contam com a invisibilidade em noticiários, jornais e outros meios de comunicação.
O trabalho escravo acontece de diversas formas: a pessoa é forçada a trabalhar onde não quer – muitas vezes é ameaçada ou está sendo vigiada -; fica presa no trabalho por sentir que tem alguma dívida com o empregador; ou, ainda, quando as jornadas de trabalho são feitas de formas exaustivas e degradantes, como ficar sem acesso ao banheiro, sem água potável etc.
Geralmente, o tráfico de pessoas se relaciona ao trabalho escravo quando a pessoa é levada para longe de casa e é forçada a trabalhar, se prostituindo ou tornando-se escrava. As vítimas são enganadas com oportunidades milagrosas e, ao chegar no local, são exploradas de tal forma que não conseguem retornar as suas famílias.
Como combater, então, o trabalho escravo e o tráfico de pessoas?
Desde 2015, a Clínica de Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais atua exatamente nessa questão. Integrando a rede internacional Clinnect HTS, promovida pela Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, a Clínica oferece aos seus estudantes atividades de ensino, pesquisa e extensão ligados ao combate desses crimes.
Coordenado pelos professores Lívia Miraglia e Carlos Henrique Haddad, da Faculdade de Direito da UFMG, o projeto realiza uma capacitação que alia ensino teórico e atendimento a casos concretos, proporcionando uma visão crítica para identificação de elementos que configuram os delitos. Além disso, a Clínica analisa dados e jurisprudências para elaboração de pesquisas de bases teóricas-jurídicas que demonstram a real situação do trabalho escravo contemporâneo e do tráfico de pessoas no Brasil e no mundo.
De acordo com esses dados, os próprios alunos, supervisionados por advogados, realizam um atendimento mais humano às vítimas por meio da assistência jurídica e judiciária que acontece de forma integral e gratuita. Assim, o projeto auxilia a atuação do Ministério do Trabalho e Emprego e do Ministério Público do Trabalho, formando uma conexão entre as experiências enfrentadas pelo Brasil e Estados Unidos.
Pelos direitos de liberdade
Em menos de três anos, já foram realizados cerca de 50 atendimentos em cidades de Minas Gerais e de outros estados. Além disso, o projeto atuou no desenvolvimento de diversas atividades, como aulas temáticas sobre direitos sociais para a comunidade haitiana e boliviana da região metropolitana de Belo Horizonte; pesquisas dos autos de infração do Ministério do Trabalho; e, mais recente, recebeu a visita de professores e estudantes da Universidade de Michigan.
Segundo a professora Lívia Miraglia, o trabalho escravo contemporâneo ainda é um grande tabu para a maioria da população, fato que é um empecilho para o seu combate efetivo. “Percebe-se que as pessoas têm dúvidas e não compreendem ao certo o conceito do crime, de modo que a discussão sobre o tema é extremamente necessária para o seu combate. É por meio da informação e da conscientização social que se torna possível realizar um diagnóstico mais acurado do problema e, assim, desenvolver políticas públicas efetivas para a sua erradicação”, afirma.
A Fundep apoia as atividades da Clínica desde 2016, sendo responsável, inicialmente, pela concessão de bolsas aos estudantes. Para Ana Luíza Galliac, da Gerência de Atendimento a Projetos Fapemig e Lilyan Corrêa, da área de Apoio a Projetos, a divulgação da iniciativa é fundamental para mobilizar a população: “os trabalhos de ensino, pesquisa e extensão atendem as vítimas, mas também servem como um alerta para todos”, enfatiza Lilyan. “O trabalho escravo não é um problema distante de nós”, completa Ana Luíza. O projeto conta com financiamento da Fapemig.
Conhece alguém nessa situação? Ajude-nos a combater esses crimes.
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